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RECENSÕES
REVIEWS
GALILEU · e‑ISSN 2184‑1845 · Volume XXI · Issue Fascículo 2 · 1
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July Julho – 31
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December Dezembro 2020 · pp. 145‑147
APRESENTAÇÃO DO LIVRO «A CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA
NO PROCESSO PENAL» DE GERALDO PRADO
PRESENTATION OF THE BOOK «THE TEST CUSTODY CHAIN IN THE CRIMINAL
PROCESS» BY GERALDO PRADO
MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE*
manuelmonteirovalente@gmail.com
GALILEU–REVISTA DE DIREITO E ECONOMIA · eISSN 2184‑1845
Volume XXI · 1
st
January Janeiro–30
TH
June Junho 2020 · pp. 145‑147
DOI: https//doi.org./10.26619/2184‑1845.XXI.2.1.01
Submitted on October 14
th
, 2020 . Accepted on November 26
th
, 2020
Submetido em 14 de outubro, 2020 . Aceite a 26 de novembro, 2020
* Doutor em Direito pela Universidade Católica Portuguesa. Professor Associado da Universidade Autónoma de
Lisboa. Presidente do Instituto de Cooperação Jurídica Internacional. Professor do Programa de Mestrado e
Doutoramento em Ciências Criminais da PUC-RS e Professor Convidado da ESP/ANP – Polícia Federal – Brasil.
Advogado e Jurisconsulto.
1 P G – A Cadeia de Custódia de Prova no Processo Penal. São Paulo/Madrid/Barcelona/Buenos Aires:
Marcial Pons, 2019.
Iniciamos com cumprimentos dirigi-
dos ao autor, Doutor G P, que
nos presenteia com mais uma obra
1
de ele-
vada qualidade científica, à Doutora Maria
João Antunes, que connosco partilha a
responsabilidade de apresentar a obra, ao
Dr. João Calado, que representa a Marcial
Pons, a Juíza Desembargadora Giselle
Bondim, esposa do autor e, com singeleza,
na sua pessoa cumprimentar toda a famí-
lia e amigos aqui presentes neste momento
de alegria.
Gostaríamos, se seguida, agradecer o
amável convite para apresentar uma obra
de um dos mais ilustres juristas do Brasil,
da América Latina e com cimentação na
comunidade jurídica europeia, em espe-
cial portuguesa, cuja defesa do devido pro-
cesso legal e da efetiva defesa e garantias
do processo penal tem marcado a sua obra.
Apresentar um livro é uma tarefa
muito difícil, em especial um livro como
o que o Doutor Geraldo Prado nos brinda,
que reflete parte dos seus estudos, pesqui-
sas e debates dos últimos anos, e um livro
com um tema como este, atual e muito
pertinente para a comunidade jurídica e
comunidade penal, por se prender com
o mais elevado valor de justiça: a Liber-
dade. A Cadeia de Custódia de Prova
tem reflexo na decisão final de condenar
ou não condenar, ou seja, na liberdade
como maior bem e como o valor que a pes-
soa humana mais aprecia. Muitos para-
béns pelo maravilhoso livro que submete à
crítica dos pares e de todos os que estudam
direito [processual penal].
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O livro apresenta uma trilogia que ora
se estatizam ora se dinamizam conforme
o tempo e o espaço em que nos encon-
tramos: prova-facto; prova-verdade; e pro-
va-poder. A esta trilogia relacional que
gravita no tempo e no espaço do Direito,
acrescentamos a prova-Direito e a prova-
-liberdade. Poder-se-ia falar em pentagonia
relacional estática e dinâmica numa cons-
trução de saber e poder como limite do
Direito de punir de forma que as funções
do Direito penal se possam concretizar:
função de garantia, função de segurança,
função de coesão social e a magnima
função de equilíbrio. A cadeia de custódia
da prova marca a pentagonia elencada e
assume importância por ser essencial a
originalidade e integridade da prova que
integra o objeto do processo conducente
a uma decisão final: condenação ou de
absolvição. Poder-se-ia afirmar que o livro
reflete esta preocupação que se manifesta
na pugna por uma justiça livre de qual-
quer maculação.
Ressalta do livro o inconformismo com
a insistente “mania” em confirmar a olhar
para os tópicos jurídicos com cânones pró-
prios de Constituições antidemocráticas [pp.
13, 18, 37, 49, 97] e a continua não subordina-
ção da interpretação normativa aos Coman-
dos de uma Constituição democrática (1988).
A continua insistência de que é pos-
sível obter a verdade real, própria dos
demonstrativistas que, por isso, sacrali-
zam e mitificam a prova pericial [p. 97],
quando a epistemologia nos ensina que o
conhecimento humano tem limites ou o
seu alcance é finito e não absoluto [produ-
zido pela perícia], pela testemunha, por ser
finito e falível como nos elucidou Popper.
O autor, ao longo das 148 pp. inquie-
tantes e provocantes, procura elucidar-nos
de que não há verdade real, sendo que a
verdade fáctica é uma construção do conheci-
mento dos sujeitos processuais e dos parti-
cipantes processuais [pp. 39, 49, 56-57, 59,
60-62], sendo, por isso, favel, mas que os
tribunais supremos teimam em não assu-
mir, como demonstra o pequeno número
de revisões de sentença [p. 37].
Também nos elucida de que a facili-
dade com que se sana e ‘salta’ a violação da
cadeia de custódia – limitando (anulando) o
contraditório à prova íntegra e autêntica, à
prova fonte e intacta, assim como promo-
vendo as sucessivas surpresas e a violação
do fair trial – é demonstrativo de uma ten-
dência em minimizar a dimensão axioló-
gica constitucional do princípio do acusa-
tório e o processo de estrutura acusatória.
A persecução criminal deve, desde a
notícia do crime, perpassando pela inves-
tigação criminal promovida pela polícia,
deve estar subordinada ao devido processo
legal [p. 101], sendo que a persecução da
Cadeia de custódia de prova – integridade
e autenticidade da prova [p. 95] – se afirma
como pilar central adequado a assegurar
todas as garantias constitucionais proces-
suais penais [p. 128-131], porque o Direito
processual penal é, como escreveu Henkel,
direito constitucional aplicado.
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O Direito Processual Penal – como
temos defendido, direito por excelência
dos inocentes, no quadro da “prova”, não
deve ser nem nunca deve ter uma “função
ritual” [p. 63], cujas recolha, conservação,
tratamento da prova devem sujeitar-se
a uma standard [mínimo] de prova pró-
prio de um Estado de direito e, na nossa
opinião, como a do Autor, a um standard
ximo probatório, por estarmos num
Estado Constitucional democrático.
Este Estado impõe a efetividade, mais
do que do princípio da legalidade [igual-
dade], do princípio da constitucionalidade
da prova que, enquanto fonte epistemoló-
gica, axiológica, teológica de limitação do
poder – saber/poder –, exige a negação da
verdade real, a negação de mera ritualidade da
prova, a negação da admissibilidade de prova
viciada [ilegal/ilícita], a negação da violação
do devido processo legal [p. 128], que se
impõe que seja justo e equitativo, sob pena
de negarmos a pessoa humana e a sua dig-
nidade, por nela residir a medula da solida-
riedade, de justiça e da liberdade.
O Autor, garantista não positivista,
não propugna um regime de impunidade
[NÃO], propõe-nos uma persecução criminal
assente no conhecimento – epistemologia
onde a verdade processual, prática, material,
judicial e válida [enquanto conhecimento
edificado ao longo do processo com uma
contrariedade processual democrática]
não seja o resultado do arbítrio, mas antes
o produto do exercício de um poder legí-
timo, válido, vigente e efetivo subordinado
ao Direito, enquanto princípios gerais do
direito, princípios gerais de cada ramos do
direito, direito positivo, jurisprudência e
doutrina.
Para que possamos, com santo Agosti-
nho, armar “que não nos vença, a sede de
vingança”.
Muito Obrigado.
Lisboa, 24 de julho de 2019